Felipe Prestes
Nem mesmo os funcionários da Companhia Riograndense de Mineração (CRM) negam o momento ruim pelo qual passa a empresa. Com dívidas a sanar, a companhia tem operado com déficit e seus equipamentos estão defasados. Porém, no subsolo guarda enorme reserva de carvão, mais de 1,5 bilhão de toneladas. No atual ritmo de mineração, a CRM possui reservas para mais 200 anos. “Tem que ter o entendimento de não lesar o Estado. Vamos entregar todo o potencial de reserva”, lamenta o diretor-financeiro do Sindicato dos Mineiros de Candiota, Hermelindo Ferreira.
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Ferreira afirma que até hoje o Sindicato não conseguiu dialogar com o Governo, e diz que o processo de privatização é pouco transparente. Como o Governo contratou o BNDES para fazer a modelagem das privatizações e ela só deve ficar pronta em 2020, há pouca informação.
“A única coisa que diz no projeto de lei é que são 550 dias de modelagem do BNDES, e que a empresa compradora dá garantia de seis meses de emprego. É um tempo pequeno e não esclarece com que salário, em que condições. É desumano”, afirma o dirigente sindical.
Os valores de venda também não estão claros, mas com as informações de que dispõe Hermelindo Ferreira avalia como um mau negócio para o Estado. “O valor que tem se falado, de R$ 400 milhões, é só o preço do maquinário. As reservas valem muito mais”.
Servidores admitem hipótese de parceria público-privada
Consciente dos problemas enfrentados pela empresa, o Sindicato dos Mineiros de Candiota entende que seria positivo até mesmo uma parceria público-privada, mas não a entrega total dos recursos que estão no subsolo. Hoje, o principal cliente, e praticamente único, da CRM é a Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica – Eletrobras (CGTEE), que pertence ao Governo Federal. O carvão minerado abastece as usinas termelétricas da empresa em Candiota.
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“O menor aproveitamento do carvão é com termelétrica, nós sabemos disto. Tem a possibilidade de gaseificação, que é totalmente estratégica. Tudo o que se faz com o petróleo pode ser feito com o carvão. Nós precisamos de investimentos. Com uma PPP, se consegue recursos e essa reserva continua na mão do Estado”, defende Hermelindo Ferreira.
A principal dívida da CRM é com a própria CGTEE. Ela deve em torno de 5 milhões de toneladas de carvão. O resultado é que entrega cerca de 170 mil toneladas de carvão por mês à CGTEE, mas recebe apenas por 100 mil toneladas, perdendo quase 50% de seu faturamento. “Isso o governo também não deixou claro como vai ficar, com quem vai ficar essa dívida. Os passivos trabalhistas, eventuais dívidas com fornecedores também”, questiona Ferreira.
O prefeito de Candiota, Adriano dos Santos (PT), ressalta que a hipótese de PPP só foi levantada pela comunidade porque existe a possibilidade de privatização, mas que, na verdade, existem soluções para a CRM sem a injeção de recursos privados. Isto porque a companhia pode ganhar dois novos clientes em breve.
Uma usina termelétrica da Ouro Negro Energia está sendo construída no município de Pedras Altas, que fica a 40 quilômetros de Candiota. E esta usina já deve participar de seu primeiro leilão de energia em setembro deste ano. Outro projeto que pode alavancar a CRM é a instalação de uma usina de gaseificação de carvão pela Vamtec S/A, que ainda está buscando investidores iniciar o empreendimento. “A CRM vai se tornar lucrativa”, projeta o prefeito.
“Impacto social é muito grande”
Adriano dos Santos teme os efeitos que a privatização pode ter na economia de Candiota. A CRM tem 244 funcionários lotados no município, que tem apenas 9 mil habitantes. Segundo o prefeito, só em vales-refeição são R$ 2 milhões por ano que saem da CRM e giram na economia local. “Não se tem uma destinação certa para esses funcionários, pode haver redução das frentes de trabalho. O impacto social é muito grande”, lamenta.
O chefe do Executivo municipal lembra ainda que a questão da CRM está, de certa forma, atrelada à da CEEE, pois os servidores da companhia de mineração estão vinculados à Fundação CEEE, como aposentadoria complementar. “O Governo do Estado tem uma dívida de R$ 1 bilhão com a Fundação CEEE (o Governo fala em R$ 600 milhões). Como vai ficar esta dívida? Pode gerar um caos trabalhista e social”, projeta. “Lá em 1997, quando se vendeu parte da CEEE, a dívida do Estado não diminuiu”, ressalta.
Procurado desde a semana passada, o secretário de Meio Ambiente e Infraestrutura, Artur Lemos, não deu retorno para falar sobre a Companhia Riograndense de Mineração. Procuramos também o líder do Governo na Assembleia, Frederico Antunes (PP), que limitou-se a dizer, por meio de nota, que “acredita que o Parlamento gaúcho terá entendimento da importância da aprovação da privatização das estatais, como ações estratégicas e fundamentais para o futuro do Rio Grande do Sul”.
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